PRIMEIRA PÁGINA | FOTOGRAFIA | SÉRIES | TWITTER | FACEBOOK
Destaque Quitandas e a volta aos tempos românticos Thiago Schwartz


Blog •

domingo, agosto 22, 2010

O motorista iraquiano

*Anderson Paes | www.twitter.com/andersonpaes

No meu último dia em Londres, a caminho do aeroporto de Heathrow, o motorista que me leva até lá é um iraquiano que foge ao estereótipo pré-fabricado no ocidente. Um sujeito com seus 40 e poucos anos, olhos claros, cabelos brancos. Um sotaque aparente, simpatia e indignação.

Bom, isso só descobri no caminho para o aeroporto. Sabe-se lá porquê me perguntou sobre a Holanda, pensando que eu fosse de lá. Quando eu disse que era brasileiro e novas perguntas vieram. Tínhamos algo em comum agora. “Temos um povo acolhedor em comum. Os latinos e as pessoas do Oriente Médio são mais felizes e acolhedoras, não são?”, perguntou ele, sorrindo. Concordei e comentei que conheci alguns árabes no tempo que vivi no Canadá, sempre fazendo piadas. Ele completou: “É, a gente tem que superar com o humor”. Algo que reconheci bem brasileiro.

Em seguida questionou se as coisas eram caras, se comparássemos Brasil e Inglaterra. Talvez pelo peso da minha mala, que só anda pesada porque cansei de carregar duas e coloquei a pequena dentro da maior. Bem, ele não conhece nossa carga tributária.

Mas o assunto foi interrompido por uma questão de trabalho:
— Terminal 5, certo?
— Sim, cinco.

Passado uns minutos, enquanto eu olhava pela janela as casas sem grades, ele tocou no assunto da guerra e na esperança que ainda tem. Comentei que os americanos estão deixando o Iraque. Ele disse que sim e continuou: “Mas essa guerra, essa coisa toda que acontece na minha terra, é por dinheiro. Ninguém se importa se somos muçulmanos, cristãos ou qualquer outra coisa. Disseram que havia armas por lá e não havia nada. Só desculpa. Só querem saber do dinheiro. E essa gente é tão gananciosa que no fim alguma razão têm uns loucos como Chávez e Ahmadinejad. É bem capaz de outra guerra começar. Gananciosos!”, exclamou, mostrando-se indignado.

O Terminal 5 estava próximo. O clima londrino com umas nuvens escuras viraram pergunta: “Você gostou do clima de Londres?”, questionou. Concordei e disse que me sentia bem naqueles 19 graus – depois de quase um ano vivendo no frio já não enfrento mais o calor do mesmo jeito.

“É aqui. Você já esteve aqui antes?”, perguntou enquanto parava o carro. Paguei a viagem e ele me ajudou com a mala. Agradeceu a corrida e a conversa.

E hoje penso que o iraquiano de Londres gostava de conversar e talvez, mais que isso, tivesse necessidade de ser ouvido. A população em geral não tem tanto espaço assim para comentar o que pensa e muitos não sabem como, onde ou a quem dizer. Ainda mais para alguém que vem de um país em conflito, coberto de preconceito pelo mundo ocidental e inconscientemente vigiado.

1 comentários:

Rafael Martins disse...

Se eu dirigisse 8 horas por dia, também gostaria de conversar :)

Postar um comentário

 

CONTATO
Colaboradores Ana Carla Teixeira, Anderson Paes, Camila Rufine, Carlos Karan, Deyse Zarichta, Eduardo Daniel, Emanuela Silva, Emanuelle Querino,
Emmanuel Carvalho, Fabiano Bordignon, Fabrício Espíndola, Francine de Mattos, Gabriel Guedes, Germaá Oliveira, Guilherme Marcon, Isabel Cunha, Kellen Baesso, Manuela Prá, Patrícia Martins, Thiago Antunes, Thiago Schwartz, Tiago Tavares, Valter Ziantoni,Van Luchiari, Vanessa Feltrin, Vitor S. Castelo Branco, Viviany Pfleger

©2010 GeloEmMarte.com Todos os direitos reservados. As opiniões aqui expressas são de responsabilidade de seus respectivos autores.