*Eduardo Daniel | www.twitter.com/eduardosdaniel
Tudo parecia perdido em Interlagos no dia dois de novembro de 2008, até que uma multidão tomada de esperanças transformou o que era um mar vermelho de bonés e camisas da Ferrari, em uma imensidão branca composta por capas de chuva, fazendo um apelo por uma ajuda dos céus, que exibia nuvens e trovões. E a ajuda veio, quatro voltas depois, a seis do final do Grande Prêmio Brasil, a última prova da temporada.
Quando a chuva caiu forte, as chances de que algo surpreendente acontecer na última corrida do ano e, o título ficasse com o brasileiro Felipe Massa, levantou os milhares de amantes do automobilismo das arquibancadas. O que se viu a partir daí foi uma das maiores emoções vividas por todos os presentes no autódromo José Carlos Pace.
O que a televisão mostrou, todo mundo viu. O que se passou debaixo daquela chuva com sabor de esperança, só quem estava lá sentiu.
As ameaças de Sebastian Vettel ao quarto colocado Lewis Hamilton provocaram um verdadeiro clamor ao possível herói nacional encarnado no jovem e promissor alemão. Massa precisava vencer e o inglês da McLaren terminar ao menos em quinto. E a torcida surtiu efeito.
Atônitos, gritávamos todos sem emitir palavras inteligíveis. Faltavam três voltas para o final quando Vettel deixou Hamilton para trás e a perseguição do inglês virou implacável curva a curva. Ninguém mais estava calado. Ninguém estava sentado. Almofadas e bonés voavam pelos ares.
Poucos, no entanto, notaram que no caminho estava Timo Glock. Outro alemão. Um o herói. O outro, o vilão da história.
Eu com o rádio grudado no ouvido direito, o volume no máximo. Uma volta para o final. A cada metro o título de Massa se aproximava. Do setor A, com uma visão da entrada da reta de chegada vimos o ferrarista passar rumo à vitória.
No telão, a imagem de jubilo nos boxes da Ferrari era paradoxal ao que ouvíamos no rádio, de que Hamilton havia ultrapassado. Acreditávamos que era Vettel de quem falavam. Vettel passou por nós à frente de Hamilton e tínhamos certeza de que erraram no rádio. O delírio era contido pela dúvida apavorante. A notícia veio tão rápido quanto curta foi a sensação de termos de novo um campeão de Fórmula 1.
Se à frente dos televisores Brasil à fora, aconteceu choro, lá, em Interlagos, tudo ficou engasgado. O estado era de choque. Não teve palavra trocada com ninguém. Cada um catou suas coisas e avançou em direção aos portões. Nem os hinos brasileiro e italiano consolaram a multidão silenciosa que seguiu aos seus destinos debaixo de uma chuva que caiu ainda mais forte no final da corrida.
A corrida foi surreal. Coisa de filme. Quem lá esteve está irmanado com os “sobreviventes” do Maracanaço. Quem viveu pessoalmente o momento daquele domingo, conseguiu descobrir o que querem dizer aquelas testemunhas do silêncio de 1950. Foi emocionante. Foi triste. Temos agora dois heróis: Vettel e Massa, mas um Ghiggia, encarnado em Glock e Hamilton.
Nunca vi, falando daquela Seleção de 50, um vilão em Barbosa, o goleiro que morreu sem ser perdoado pelo Brasil. Prefiro sempre acreditar também que quando um árbitro erra em uma partida de futebol, não é por maldade, mas por falha da qual nós, os humanos, estamos constantemente à mercê.
Não suporto opiniões do tipo: “se o juiz desse aquele pênalti pro Santo André o São Paulo ia perder o jogo”. Discordo. O empate naquele momento poderia provocar uma reação no Tricolor Paulista para aplicar quatro, cinco gols.
Glock de fato não trocou seus pneus. Aquela corrida teve de tudo. Sol, chuva, tempestade, sol de novo e chuva de novo. Por não parar quando todos pararam há poucas voltas do fim, Glock se posicionou no pelotão da frente. Olhando do lado de fora é difícil imaginar que o piloto não pôde segurar mais uma curva ao menos e na reta pisar fundo sem problemas com os pneus inadequados.
Não posso acreditar que um piloto de outra equipe teria permitido uma ultrapassagem desleal para entregar a um terceiro o título mundial na bandeja, mas, depois de tudo o que aconteceu com o caso Renault, Nelsinho Piquet, Flavio Briatore, Fernando Alonso e companhia no GP de Cingapura do ano passado, uma apuradinha naqueles instantes finais da corrida em São Paulo não seria má idéia...
quarta-feira, setembro 23, 2009
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5 comentários:
No começo ler o texto foi até difícil pra mim só de lembrar as emoções que passei naquele dia. Ficou muito marcado pra mim. Ainda aguardo um título de Felipe Massa, e só dele, para apaziguar essa ferida na alma.
Eu lembro q nesse dia, eu tava visitando o Salão do Automóvel, lá no Anhembi (São Paulo). Na hora que o Hamilton perdeu a posição, foi emocionante ver 10 mil pessoas berrando e aplaudindo, dentro de um salão fechado.
As Ferrari e as Lamborghini ficaram de lado, e todo mundo só procurava uma televisão, pra poder ver o final da corrida. O silêncio no final da prova era sepulcral, só interrompido quando uma Ferrari do Salão foi ligada.
Essa corrida foi para ficar na história mesmo... Era impossível assistir aquele final sentado...
Mas eu lembro muito bem que no final da corrida, nas últimas voltas, assim que o Vettel ultrapasou o Hamilton eu perguntei na hora como estava o Glock...
Se tivesse algum tipo de marmelada, seria muito mais fácil o Glock parar e não ficar na frente do Hamilton em hora nenhuma.
Esse momento é, sem dúvida nenhuma um dos momentos mais emocionantes na história do esporte mundial.
Sinceramente, se for investigado e comprovado que o Glock deixo o Hamilton passar, isso seria o que? Crime?
Vamos imaginar assim, eu sou o Glock e você o Hamilton, eu deixo você passar para ser campeão do mundo, isso é interamente problema MEU, APENAS MEU.
Não existe punição por ser ultrapasado.
"Olhando do lado de fora é difícil imaginar que o piloto não pôde segurar mais uma curva ao menos e na reta pisar fundo sem problemas com os pneus inadequados."
O posta estava excelente... até chegar aí. Aande com os pneus do carro carecas em dia de chuva ou de kart de pneu slick na chuva, aí quem sabe você arruma essa última parte e o post fica muito bom...
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